Os clássicos da Medicina Chinesa enfatizam
a importância na compreensão da "transmissão" dentro do processo da
doença. Não é o suficiente analisar uma condição isoladamente em seu estado
atual. É preciso entender de onde veio e para onde ela poderia potencialmente
progredir.
O Livro 2, capítulo 5 do Yi Jia Jing afirma
que "Se não se entender a raiz e os limites da propagação das doenças, então
o conhecimento da acupuntura é profundamente cortado" Os textos
fundamentais da medicina chinesa clássica, ou seja, o Shang Han Lun e Nei Jing,
dedicam muito tempo para discussão da progressão da doença. Um tratamento
clássico deve abordar o passado, o presente e o futuro de uma condição
patológica.
A Medicina Chinesa é uma medicina
paliativa, preventiva e de convalescença, que ajuda a prevenir e curar doenças,
bem como reconstruir e regenerar o corpo. De acordo com no clássico Shen Nong
Ben Cao, a mais alta forma de medicina é considerada preventiva; ervas
classificadas como preventivas são consideradas como as de "grau mais
alto." O tratamento de uma doença manifestada é considerado como sendo de
"grau inferior." Fórmulas com ervas são frequentemente compostas de
ervas de todos os três graus, ou seja fazem o tratamento do atual estágio da
condição, bem como da sua origem. Fórmulas muitas vezes tentam impedir a
transmissão para estágios mais profundos de penetração da doença também.
Acupuntura, praticada dentro da tradição clássica, formula combinações de
canais e pontos da mesma maneira.
O Ling Shu faz uso dos sistemas de seis canais
para ensinar a progressão da doença a partir do um ponto de vista da
acupuntura. A compreensão da transmissão e progressão são fundamentais para a maioria
das discussões dentro da medicina chinesa clássica. O Shang Han Lun é um
tratado sobre a progressão da doença. Os canais primários, como ensinados no
Ling Shu, também são um tratado sobre a progressão da doença. Eles não são
apresentados como entidades segmentadas no Ling Shu, eles são vistos como um
continuum, representando o processo patológico: da condição mais externa para a
mais profunda e mais grave. Em vez de ver a progressão da doença em termos de
"zonas": Tai Yang, Shao Yang, Yang Ming, como Shang Han Lun faz, o
Ling Shu vê e analisa a progressão da doença através dos Canais Principais eles
são acoplados em Metal, Terra, Fogo, Água, Fogo , Madeira: Do Pulmão ao Fígado.
Durante o tempo da Dinastia Han (206 aC -
220 dC), quando o Nei Jing e Shang Han Lun foram compilados, Vento e Frio eram
tidos como as principais causas de patologias externas. Calor, Secura, Umidade
e Calor do Verão eram consideradas transformações de Vento e Frio e, portanto,
visto como secundários. Dentro do Ling Shu , o Canal de Pulmão é representativo
de uma condição de Vento-Frio e por isso é designado o primeiro canal dentro do
Continuum dos canais primários. A transformação de Vento-Frio para Vento-Calor
e Vento-Umidade é representada pelo segundo canal no continuum: o Intestino
Grosso. Penetração para o interior, criando uma condição de "excesso"
interna é representada pelo Estômago. A tributação sobre o Qi e Sangue são
representados pelos canais do Baço e Coração, respectivamente.
Ao nível do Intestino Delgado, um evento
curioso ocorre dentro do corpo. O agente patogênico é absorvido ao terreno mais
profundo do corpo em um estado de latência. O nível do Intestino Delgado representa
um estado de Estase de Sangue. Ele também introduz o conceito de latência. Os
pontos ID18 " Liao da Maçã do Rosto" e ID12 "Agarrar o
Vento" representam a absorção de um fator patogênico não resolvido para o nível
dos ossos, como representado pela escápula e ossos da face. A partir da discussão
sobre Canais primários do Ling Shu, sugere-se que a latência pode envolver o
Sangue e ossos.
Latência esconde um fator patogênico. Esta é a fase onde a
condição patológica torna-se traiçoeira e misteriosa. O sistema imunológico do
corpo pode estar numa condição de sobrecarga ou os humores do corpo
continuamente deficientes, mas a causa disso pode ser obscura. Um agente viral
ou bacteriano pode não aparecer nos testes sanguíneos ocidentais durante um
estado de latência. No entanto, ao compreender a progressão da doença, um
praticante de Medicina Clássica Chinesa deve ser capaz de explicar esses
sintomas misteriosos. Muitos desses "misteriosos" sintomas são
atribuídos aos Vasos de Luo e Canais Divergentes: Dois sistemas de canais que
lidam com latência através do Sangue e Ossos.
Um acupunturista chinês com formação clássica pode argumentar
que o conhecimento dos Canais Principais por si só não é suficiente para
compreender os conceitos sutis de Medicina Chinesa, como o conceito de
Latência. Os chamados "Canais Secundários" da acupuntura fornecem uma
discussão mais aprofundada sobre o conceito de latência e como ela funciona
dentro do corpo. Os vasos Luo e Canais Divergentes são dois sistemas de canais
que fornecem a maior compreensão dos conceitos e de tratamento de latência. Eu
gostaria de me concentrar principalmente na explanação sobre os vasos Luo.
Os Vasos Luo
Os Vasos Luo são canais de latência. Eles
prendem os fatores patogênicos. Vasos Luo são condutos de Ying Qi
"nutritivo": Sangue e fluidos corporais Jinye. Dentro da teoria dos
"Cinco Pontos ShuTransporte" ou "antigos", o ponto Luo,
localizado após o ponto Shu-Riacho , ilustra a função do Sistema de canais de
vasos Luo. O ponto Shu-Riacho representa a divisão entre os níveis externos e internos
do corpo. No momento em que um agente patogênico atinge o ponto Luo, ele já
entrou no interior, o que sugere o exterior ,ou seja, o "nível Wei"
falhou em manter a condição patológica no exterior. Nesta fase, há o perigo do
agente patogênico entrar no ramo interno do canal principal onde irá ter acesso
ao órgão Zang ou Fu. Do ponto Luo, um ramo "colateral" é formado para
translocar o agente patogênico para longe do canal principal, onde pode ser
mantido num estado de latência. Os vasos Luo usam "Ying Qi " para
manter o estado de latência.
Os Canais Tendino-Musculares representam o
nível mais superficial do Qi dentro do corpo: são condutos do Wei Qi
"defensivo". Eles são a primeira defesa do corpo contra o meio
ambiente e fatores patogênicos externos.
Wei Qi é apoiado por Ying Qi, produzido no estômago através dos fluidos Jinye.
Ele também é apoiado pelo yang qi,
enraizado nos Rins.
O Nan Jing ensina, através dos princípios
do Yin e Yang, o conceito de transformação mútua. Ying Qi apoia o "nível
Wei" transformando-se em reforço para o Wei Qi. Quanto mais grave uma
condição, mais os reforços são chamados. O Nan Jing também ensina que excesso
leva à deficiência, e a deficiência leva à progressão da doença. Quando um
fator patogênico é grave, ele pode criar deficiência, esgotando Wei Qi e os
humores que o suportam.
A Escola do Shang Han Lun dá pistas sobre a
progressão de uma condição externa no âmbito dos Estágios Yang. Dentro da fase
inicial Tai Yang associada com "Vento-Frio", pode-se prever onde para
onde provavelmente a patologia irá progredir com base em deficiências que já
existem, ou naquelas que estão começando a aparecer. A progressão para a fase
de Yang Ming baseia-se na porção leve dos fluidos Jinye ou seja no Jin
produzido pelo estômago. Se os fluidos Jin esgotarem, é provável que a condição
Tai Yang vai avançar para a fase de Yang Ming. Se nessa nova situação o Yang Qi
for insuficiente ou tornar-se exaurido, a condição provavelmente irá seguir
progredindo para Shao Yang.
Quando os canais tendino-musculares Yang
falham, os patógenos se movimentam para os canais tendino-musculares Yin, que estão localizados
nas regiões do pescoço, tórax e abdômen. O Capítulo 5 do Ling Shu apresenta uma
discussão interessante intitulada "Raízes e Terminações". Todos os
canais de acupuntura dos membros inferiores são descritos como começando no
ponto Poço/Jing e "terminando" em pontos específicos locais no corpo.
Os canais Yang terminam na região da cabeça, os Canais Yin terminam na
garganta, peito e do abdômen. As descrições dos canais nesse capítulo não são as
dos Canais Principais, mas se assemelham muito mais com as dos Canais
Tendino-Musculares, que também começam nos pontos Poço/Jing.
fonte: Ephraim Ferreira Medeiros
(www.medicinachinesaclassica.org)